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Rasuras marginais à Carne falsa

por Ronald Augusto*

patrícia, a prosa nervosa de carne falsa. às vezes esse convite à colaboração do leitor. mas depois, caso esse mesmo leitor ninguém se recuse ao desafio, a autora dá-lhe um piparote. portanto, uma hostilidade enviesada na construção do texto, uns trancos inesperados, umas minúsculas emboscadas no logos da narrativa, uns cortes mallarmaicos que revelam espaços gráficos. os eles e elas, mesmo que mais ou menos prototípicos, se esfacelam em vaginas, sêmen, calcinha, gastrites, prédios acesos no escuro estelar, habitáculos do absurdo. e às vezes deparamos o epos resolvido numa linha que se rompe, de repente, contra a brancura da página, um respiro. esses contos de uma linha não merecem o nome de minicontos, são o acento átono, a pausa a contrapelo da redundância novelística, contra a qual patrícia investe. e o eu de sua prosa, a voz lírica, lúbrica, é mais a presentificação no solo duro da linguagem do solilóquio de um ego scriptor do que qualquer outra coisa. esse excerto “vive na craca incrustada no tédio”, a nervura dessa prosa imagética como “faca de desossa”. a analógica serial  de pesadelos narrados à maneira de anedotas cruéis, habitados por personae de bosta, uma gente cheia de intestinos, colocações, tropeços, gente “azul de tão burra”. carne falsa, cadafalso ao prosaico bipolar, da tragédia do herói míope “com olhos de sobrevivente de auschwitz”. os excessos em carne falsa entram na conta de acertos. excessos: o apetite em ser foda na escritura; a proximidade liminar com o poema; a transformação do leitor em sparring; a fragmentação, etc. são acertos porque a escritora dispõe deles com uma pegada autêntica, não restando, portanto, nada de decorativo em sua utilização. é isso: patrícia galelli. meu abraço (e assino embaixo pois é livro bom), ronald.

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Ronald Augusto é escritor, poeta, músico, ensaísta e filósofo. Teve publicações em revistas literárias nacionais e internacionais. Autor dos livros Confissões Aplicadas (2004), Cair de Costas (2012), Decupagens Assim (2012), Empresto do Visitante (2013), Nem raro nem claro (2015) e À Ipásia que o espera (2016), Homem ao Rubro, Puya, Vá de Valha, No Assoalho Duro, Oliveira Silveira: poesia reunida, entre outros. Co-fundador da Editora Éblis, editor do site Sibila e tem colaborações nos cadernos de cultura do Diário Catarinense e Jornal Zero Hora.

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